Conselho de Psicologia do Paraná condena edital da PM: “discriminatório e preconceituoso”

O Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP/PR) classificou o edital de concurso da Polícia Militar do estado (PMPR) como discriminatório e preconceituoso. O regulamento da seleção exige dos candidatos teste psicológico que pretende avaliar se eles têm ou não “masculinidade”, termo definido no edital de abertura como a “capacidade de o indivíduo em não se impressionar com cenas violentas, suportar vulgaridades, não emocionar-se facilmente, tampouco demonstrar interesse em histórias românticas e de amor”.

Para Maria Ângela Oliveira, coordenadora da Comissão de Avaliação Psicológica do CRP/PR, o que deve ser avaliado é a capacidade do candidato de demonstrar raciocínio para resolver determinada situação que possa surgir devido a sua função. “Isso independe se ele tem masculinidade ou não, independe de ser homem ou mulher. Ou seja, o edital apesar de aceitar que 50% das vagas sejam preenchidas por candidatas, as discrimina, e também é preconceituoso com os homens, que não devem demonstrar sensibilidade”, argumenta.

Em sua defesa, a PMPR diz que todos os testes psicológicos para ingresso na corporação (para oficiais ou praças) buscam o levantamento e síntese de informações com base em procedimentos científicos e em instrumentos aprovados pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP). O argumento, porém, não convence Maria Ângela. Segundo ela, os testes psicológicos são mesmo validados pelo CFP, mas a escolha por qual teste aplicar cabe ao avaliador.

“Para elaborar um edital de concurso, o avaliador tem que estar atento às consequências e à repercussão dos testes e dos termos que vai usar para classificar as escalas de personalidade”, diz a psicóloga. O CRP informou ao Concursos que avalia a possibilidade de emitir nota de repúdio ao edital ainda nesta segunda-feira (13/8). O concurso está sendo avaliado na comissão de psicologia e no departamento jurídico do órgão, que está fazendo uma varredura nos testes legais, já que o construto utilizado é incomum. O Concursos entrou em contato com o CFP, mas até a última atualização desta matéria não obteve resposta.

O Ministério Público do Paraná também informou que já está analisando o edital para tomar as medidas que forem necessárias.

Desde 2013

Segundo a PMPR, o teste psicológico é aplicado dessa forma desde 2013, e que “é comum em outras instituições de segurança pública, e até mesmo em empresas privadas”, para avaliar a capacidade dos candidatos não se impressionarem com cenas violentas, vulgares e hostis.

De acordo com a nota, a PMPR alegou que “não compactua e não tolera comportamentos e posicionamentos discriminatórios de qualquer natureza e que respeita os Direitos Humanos e a Constituição Federal, sempre prezando por uma sociedade igualitária”.

A PM afirmou ainda que usa o termo “masculinidade” com o objetivo de avaliar a estabilidade emocional e a capacidade de enfrentamento, “aspectos estes extremamente necessários para o dia a dia da atividade policial militar”. A PM afirmou ainda que a “característica”, isoladamente, não avalia componentes de gênero (masculino e feminino), e que esse não é o objetivo da avaliação. A corporação, no entanto, não mencionou nada sobre o restante da descrição do termo masculinidade, descrito no edital do concurso, como a capacidade de “tampouco demonstrar interesse em histórias românticas e de amor”.

No entanto, para Héder Bello, psicólogo e pesquisador sobre questões de gênero e sexualidade e colaborador do Conselho Federal de Psicologia, avaliar a estabilidade emocional é diferente de pensar masculinidade. “O edital é preconceituoso e precisa ser revisto. O CRP do Paraná já se posicionou em relação a isso. Essa leitura é preconceituosa e há uma confusão em relação a esses conceitos. Masculinidade é diferente de estabilidade emocional.”

 

Denúncia

Na última sexta-feira (10/8), o Concursos denunciou que o edital, com 16 vagas para cadetes, contém item polêmico, presente no anexo II do documento, que exige um resultado igual ou acima de “regular” para “masculinidade”, que seria a “capacidade de “não emocionar-se facilmente, tampouco demonstrar interesse em histórias românticas e de amor”. É exigido ainda que o candidato demonstre a competência de “não se impressionar com cenas violentas e que possa suportar vulgaridades”.

Outros itens do teste psicológico também chamam atenção, como “amabilidade” e “afago”. Neste último, o candidato deve ter resultado menor ou igual a “médio” para necessidade de buscar apoio e proteção, e sobre o quanto deseja ser “amado, orientado, perdoado e consolado”. Além disso, será avaliada a necessidade de ser protegido de sentimentos de abandono, ansiedade, insegurança e desespero, que também deve ser igual ou inferior a “médio”. Serão medidas também características de instabilidade emocional, passividade, liberalismo, busca por novidades, interações sociais, afiliação, empatia, dominância e outras.

Para Max Kolbe, advogado e especialista em concursos públicos, o edital apresenta subjetividades exigidas como perfil profissional que “transcendem o limite do absurdo”. Ele explica que a realização de exames psicológicos é legítima, porém a adoção de critérios meramente subjetivos, que possibilitem ao avaliador um juízo arbitrário, afronta a garantia de ampla defesa. Já para a psicanalista Thessa Guimarães, o termo “masculinidade”, igualado a citada definição é uma evidência do discurso de machismo no Brasil e representa um retrocesso. Saiba mais sobre o assunto aqui. 

Fonte: Correio Web

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